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    segunda-feira, 30 de junho de 2025

    Professores tomam as ruas contra municipalização de escolas estaduais em Cataguases

    Manifestação pacífica questiona sustentabilidade financeira do projeto que pode gerar déficit de R$ 6,1 milhões anuais aos cofres municipais




    No último sábado, 28 de junho, as ruas de Cataguases foram ocupadas por professores da rede estadual em uma passeata que expressou, com firmeza e indignação, a resistência à municipalização das escolas estaduais Guido Marliere e Coronel Vieira. O movimento, organizado por profissionais da educação e apoiado por setores da comunidade escolar, lançou um alerta público sobre os riscos da adesão ao Projeto Mãos Dadas, promovido pelo Governo de Minas Gerais.

    A mobilização teve início na manhã de sábado, com cada grupo saindo de sua respectiva escola - Coronel Vieira e Guido Marlière - percorrendo diversos pontos da cidade com faixas, cartazes e materiais informativos. Durante o trajeto, os educadores conversaram com os moradores, explicando o que significa a municipalização e quais seriam suas possíveis consequências para o sistema público de ensino em Cataguases. O encontro das duas escolas aconteceu no início do calçadão, no Centro, onde foi realizado um ato com falas públicas e palavras de ordem. A manifestação foi encerrada na Praça Rui Barbosa.

    A manifestação não foi apenas simbólica: ela revelou um sentimento coletivo de insegurança em relação ao futuro da educação municipal. O receio maior recai sobre o impacto financeiro, estrutural e pedagógico que a mudança pode causar, além da ausência de diálogo efetivo com a população e os profissionais diretamente envolvidos.

    Os organizadores fizeram questão de esclarecer pontos importantes durante o ato. Primeiro, destacaram que o movimento não tem como alvo os profissionais da rede municipal. Pelo contrário, muitos dos participantes atuam tanto no Estado quanto no município e conhecem a realidade das duas redes. A preocupação central é com a capacidade do município de absorver novas responsabilidades sem prejuízos à qualidade do ensino oferecido.


    Também foi esclarecido que uma carta sem identificação de autoria, que circulou recentemente nas redes sociais com ataques a profissionais da rede municipal, não tem qualquer ligação com o movimento. Os educadores alertaram que esse material tem sido usado para criar divisões entre os trabalhadores das duas redes, desviando o foco da discussão principal, que é de ordem estrutural e administrativa.

    Outro ponto reforçado foi que a municipalização não é obrigatória. A legislação determina que a oferta da educação infantil é de responsabilidade do município, enquanto o ensino fundamental deve ser garantido por meio de colaboração entre Estado e municípios. Assim, não há exigência legal para que o município assuma as escolas estaduais.

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    O prefeito José Henriques já se mostrou favorável à proposta e apresentou aos vereadores a expectativa de um repasse de R$ 19.362.000,00, a ser feito em parcela única, oriundo do Governo do Estado. O valor, segundo a gestão municipal, poderia ser aplicado em toda a rede de ensino. No entanto, por trás da cifra atrativa, técnicos apontam um cenário preocupante.

    Segundo dados do Inep e do levantamento técnico do Dieese para o Sind-UTE/MG, a transferência de gestão das duas escolas representará o acréscimo de mais de novecentos alunos à rede municipal – um aumento de 72,5% nas matrículas dos anos iniciais do ensino fundamental. A escola estadual Coronel Vieira possui 499 estudantes e 29 servidores efetivos; já a Guido Marliere tem 423 alunos e 20 servidores. Ao todo, o município assumirá 922 estudantes e 49 profissionais, podendo aumentar nos anos seguintes.

    A questão central é que o valor prometido pelo Estado não garante a sustentabilidade da operação no longo prazo. A estimativa é de que, para manter o atual padrão de qualidade, a Prefeitura precisará investir cerca de R$ 13,3 milhões por ano. No entanto, o aumento real de receita será de apenas R$ 7,2 milhões. A diferença de R$ 6,1 milhões deverá sair dos cofres municipais, o que pode comprometer outras áreas e programas da educação já existentes.

    Há ainda dúvidas jurídicas e administrativas. Embora o Governo de Minas defenda que o ensino fundamental é atribuição prioritária dos municípios, a Constituição Federal e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) afirmam que essa responsabilidade é compartilhada com os estados. O discurso institucional, portanto, se apoia numa interpretação questionável da legislação.

    Outro ponto de tensão é a ausência de critérios claros para a distribuição dos recursos estaduais. A metodologia de repasse não está formalizada em documento público, e os valores são negociados individualmente entre o Estado e cada prefeitura. Além disso, o repasse está condicionado à disponibilidade orçamentária, o que agrava a insegurança.

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    No caso de Cataguases, o risco é ampliar a sobrecarga de um sistema já pressionado. Em 2024, o município investiu R$ 14.196,27 por aluno nos anos iniciais do ensino fundamental. Com a municipalização e sem aportes adicionais, o valor per capita poderá cair para R$ 11.452,23 – uma redução de quase 20% que comprometeria diretamente a qualidade da educação ofertada.

    A manifestação dos professores também chamou a atenção para o histórico local. Há pouco mais de duas décadas, Cataguases passou por um processo semelhante de municipalização, que deixou cicatrizes financeiras profundas e ainda impacta o orçamento da educação. Repetir a experiência, alertam os manifestantes, pode representar um erro estratégico.

    Além disso, o município já enfrenta dificuldades para cumprir metas do Plano Nacional de Educação (PNE), especialmente no atendimento à creche. Em 2023, 1.804 crianças de 0 a 3 anos ficaram fora das salas de aula, número que deve crescer se os investimentos forem redirecionados para absorver as escolas estaduais.

    Na Câmara Municipal, o vereador Maguinho Nóbrega (Republicanos), que solicitou audiência pública para meados de julho para discutir o tema, destaca que a proposta chegou em 2021, mas só agora o prefeito decidiu aderir diante de um possível repasse milionário.

    A situação jurídica do projeto também gera apreensão. O TCE-MG, em despacho recente, pediu esclarecimentos ao Governo do Estado sobre possíveis irregularidades no Projeto Mãos Dadas, suspendendo, na prática, novas adesões até que haja resposta e análise oficial. O próprio projeto de lei municipal ainda não foi enviado à Câmara, embora a prefeitura tenha sinalizado sua intenção ao Conselho Municipal de Educação.

    Diante de tantos fatores pendentes, cresce o apelo por prudência. A manifestação ocorreu de forma tranquila e reafirmou o compromisso dos educadores com uma educação pública de qualidade, construída com planejamento, diálogo transparente e responsabilidade com toda a comunidade escolar. Os professores que tomaram as ruas no sábado, longe de defenderem uma posição política, levantaram uma bandeira de responsabilidade e planejamento. A pergunta que ecoa entre educadores e especialistas é simples, mas crucial: o município está preparado para essa conta?

    Por Mídia Mineira.

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