Minas Gerais será cenário de uma pesquisa científica sem precedentes sobre a produção do queijo artesanal nos cinco polos mais tradicionais do Estado. As estratégias a serem adotadas por esse estudo foram debatidas nesta quarta-feira (7/8/13), em audiência pública da Comissão de Política Agropecuária e Agroindustrial. A expectativa é de que a pesquisa possibilite a regulamentação da Lei 20.549, aprovada pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) no final do ano passado e que dispõe justamente sobre a produção e a comercialização desse produto. A nova lei, mais do que a simples valorização do queijo artesanal mineiro, estabeleceu um novo marco legal para a expansão da atividade, que faz parte do patrimônio histórico mineiro, mas vinha sofrendo com o rigor da fiscalização sanitária.
A pesquisa, cujo financiamento ainda está sendo viabilizado, vai abranger as regiões da Serra da Canastra, Serro, Araxá, Cerrado e Campo das Vertentes. Serão visitados 149 produtores já cadastrados, em dois períodos, na época das chuvas e na estiagem, coletando dados no leite e no produto acabado.
O objetivo é identificar tanto os patógenos (micro-organismos causadores de doença) quanto outros componentes da flora microbiana na produção do queijo, apurar a possibilidade de reduzir o tempo de maturação atualmente exigido e contribuir para o aprimoramento do produto. Devem ser envolvidos nesse esforço científico entidades cujo trabalho de pesquisas é reconhecido até internacionalmente, como Embrapa, Emater e universidades federais.
Além de tomar conhecimento da pesquisa, os participantes da reunião também agradeceram à ALMG por seu empenho em torno do tema, amplamente debatido ao longo do ano passado. A mobilização liderada pelos deputados culminou na aprovação da nova lei e, na última terça-feira (6), resultou na assinatura de uma nova instrução normativa pelo Ministério da Agricultura que permitirá ao produtor mineiro de queijo artesanal, maturado em período inferior a 60 dias, comercializar seu produto em todo o País. Na prática, os serviços de inspeção sanitária de Minas ganham autonomia para expedir documento que legaliza a comercialização.
Vender o queijo artesanal mineiro em outros Estados era a mais antiga reivindicação dos produtores, a maioria ainda atuando na clandestinidade. Eles comparam a sua situação aos produtores de queijo artesanal franceses, altamente valorizados em todo o mundo. “Há 15 anos que se discutia isso sem resultado. Os produtores podem comemorar. Essa vitória começou aqui, na Assembleia”, resumiu o deputado Antônio Carlos Arantes (sem partido), presidente da Comissão de Política Agropecuária.
Mas, de acordo com o parlamentar, ainda há muito a ser feito para colocar o queijo artesanal mineiro, cuja qualidade é reconhecida em todo o País, no patamar que ele merece, trazendo reais benefícios para os produtores. Nesse sentido, a pesquisa que está sendo planejada será o primeiro passo.
“A produção de queijo artesanal está na ordem do dia do Brasil. A caminhada é longa, mas o esforço da Assembleia tem valido a pena e estamos avançando”, complementou o deputado Fabiano Tolentino (PSD). Segundo o deputado Adelmo Carneiro Leão (PT), trata-se do resgate de um legítimo patrimônio mineiro com 300 anos de história. “Presenciamos nos últimos anos ações de Estado para caçar o queijo artesanal como se ele fosse um bandido. Nesse sentido, a pesquisa deverá ter um olhar sistêmico para definir meios de o poder público auxiliar o produtor, estimulando práticas como o associativismo ou o cooperativismo”, destacou. A reunião também chegou a ser presidida pelo deputado Romel Anízio (PP), membro efetivo da Comissão de Política Agropecuária, que também destacou o pioneirismo do Legislativo estadual.
Desafio é diminuir o tempo mínimo de maturação exigido

João Carlos Ribeiro, representante da área de fomento do Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento, lembrou que, pelos critérios vigentes, o tempo mínimo de maturação é de 17 dias para os queijos do Serro e de 22 dias para os queijos da Canastra. “Uma pesquisa dessa abrangência só vai trazer benefícios para os produtores. Já trabalhamos inclusive com a possibilidade desse tempo ser reduzido para dez e 12 dias, respectivamente. A qualidade do queijo artesanal mineiro hoje é muito diferente do que foi no passado”, afirmou.
Segundo o diretor-técnico do IMA, Thales Almeida Pereira Fernandes, o desafio a partir de agora é definir as fontes de financiamento para o estudo, tarefa para a qual ele pediu o apoio dos deputados. “Os estudos existentes sobre a produção de queijo artesanal são muito questionados pela aplicação de metodologias variadas, e essa pesquisa vai aplicar uma única metodologia nas cinco regiões produtoras do Estado, o que é um grande avanço”, destacou.
A supervisora do Laboratório de Segurança Microbiológica em Alimentos do IMA, Liliane Denize Miranda Menezes, estimou os custos da ordem de R$ 250 mil a R$ 300 mil por região pesquisada. Sobre esse assunto, o assessor-adjunto de Planejamento e Gestão da Fapemig, tradicional órgão financiador de pesquisas, destacou ser importante o envio, o mais rápido possível, do projeto com o detalhamento financeiro para a direção do órgão. “Não tenho dúvidas de que a Fapemig será mais uma parceira nessa iniciativa. É importante agregar valor ao queijo artesanal mineiro pois, com a realização da Copa do Mundo, todos os olhos do planeta estarão sobre nós”, lembrou.
Matéria-prima - Coube a Márcio Roberto da Silva, pesquisador da Embrapa Gado de Leite e integrante do grupo de trabalho para a regulamentação da chamada Lei do Queijo, detalhar aos participantes da audiência pública explicar como será realizada a pesquisa. “Nossa premissa é de que um queijo minas artesanal de qualidade precisa, em primeiro lugar, de um leite de procedência indiscutível. A pesquisa vai dar mais respaldo à lei, orientando a fiscalização e o aprimoramento dos produtores”, apontou. Na sua apresentação, o pesquisador traçou um panorama da produção agropecuária no Brasil e em Minas, destacando a importância de se zelar pela qualidade do leite e de seus derivados.
Na mesma linha, o coordenador em Minas do Laboratório Nacional Agropecuário (Lanagro/MG) defendeu a importância da pesquisa por se tratar de uma medida preventiva, não paliativa. “Temos que dar conta do desafio de levar ao público produtos que possam ser consumidos sem risco. É muito melhor fazer esse tipo de pesquisa previamente, e não somente na hora dos surtos”, apontou.
O coordenador técnico estadual da Emater, Álbany Árcega, elogiou a união de diversas entidades em torno do tema, enquanto o presidente da Associação dos Produtores de Queijo Canastra (Aprocan), João Carlos Leite, destacou o papel do Legislativo estadual como catalizador do processo. “Sem o apoio desta Casa não teríamos chegado tão longe. A voz da coerência falou mais alto. Antes as decisões eram de cima para baixo, e agora o diálogo tem prevalecido”, exemplificou.
Nova lei é resultado de amplo processo de discussão na ALMG
Resultado de amplo processo de pesquisa, consulta e negociações com os produtores e órgãos de fiscalização sanitária, a Lei 20.549 representa a evolução de uma lei promulgada dez anos antes, em 2002 (Lei 14.185, de 2002, revogada pela nova lei), mantendo o pioneirismo de Minas Gerais no assunto.
A lei anterior, de 2002, já contemplava o queijo minas artesanal curado – com um tempo de maturação maior. Agora, na prática, o alcance da legislação foi ampliado para outros tipos de queijo artesanal, como o meia-cura, o preferido pelo mercado, o cabacinha e o requeijão artesanal, abrindo a possibilidade ainda para que outros, que podem ou não ser produzidos com leite de vaca, sejam reconhecidos no futuro.
A grande diferença entre as duas legislações é que, pelas regras anteriores, para legalizar a produção era preciso primeiro adaptar a queijaria às regras vigentes para só depois se registrar o produto no Instituto Mineiro de Agropecuária (IMA). Agora, com o objetivo de estimular o cadastro dos produtores no órgão de controle sanitário do Estado para obtenção do registro ou título de relacionamento, criou-se a figura do termo de compromisso. Apesar de a nova lei ainda precisar ser regulamentada, isso significa que o produtor ficará autorizado a comercializar seus queijos durante um determinado período, que poderá inclusive ser ampliado conforme as metas sejam cumpridas, até que consiga a habilitação sanitária definitiva.
Para facilitar essa transição, na Lei 20.549, de 2012, há até a possibilidade de indenização para os produtores cujos animais tenham que ser sacrificados. Uma verba de R$ 900 mil foi incluída pela ALMG no Plano Plurianual de Ação Governamental (PPAG), que reúne as políticas públicas no orçamento anual do Estado, para essa e outras iniciativas.
A Lei do Queijo também especifica as condições necessárias e as fases para a produção dos vários tipos de queijos artesanais visando a assegurar sua qualidade e inocuidade, fixando ainda normas para a construção e funcionamento de queijarias e até para o trabalho do queijeiro, o negociante de queijos.
Fonte: ALMG
0 comments:
Postar um comentário