Projeto foi aprovado por 12 votos mesmo com recomendação contrária do Ministério Público e críticas sobre possível clientelismo
A Câmara Municipal de Cataguases ignorou recomendação do Ministério Público e aprovou, na sessão ordinária desta segunda-feira (01/09), a controversa Proposta de Emenda à Lei Orgânica Municipal nº 01/2025. A medida, que permite ao prefeito autorizar o uso comercial de bens públicos de forma precária sem processo licitatório, recebeu 12 votos favoráveis contra apenas dois contrários: os vereadores Maguinho Nóbrega e Giovana Costa. O vereador Ricardo Dias justificou ausência.
A aprovação ocorreu mesmo após a Promotoria de Justiça local ter enviado recomendação formal aos parlamentares alertando sobre possíveis inconsistências jurídicas da proposta. O documento destacava preocupações técnicas relacionadas a aspectos constitucionais da medida, que autoriza concessões precárias de espaços públicos para comerciantes ambulantes.
O projeto, de autoria do vereador Marcos Costa (PSD) e assinado por outros 12 vereadores, estabelece que o chefe do Executivo poderá conceder espaços públicos para trailers, bancas, carrinhos de alimentos e veículos adaptados para comércio sem necessidade de licitação. A medida tem como justificativa a regularização da situação de dezenas de trabalhadores informais que atuam irregularmente na cidade há décadas.
Contudo, especialistas em direito administrativo identificam na proposta abertura perigosa para práticas clientelistas. A redação aprovada permite que futuras gestões utilizem as autorizações como instrumento de barganha política, comprometendo a impessoalidade que deve nortear a administração pública. A falta de critérios objetivos para as concessões representa outro ponto de fragilidade jurídica do texto.
A situação torna-se ainda mais preocupante quando analisada sob a ótica da segurança jurídica dos beneficiários. O caráter precário das concessões deixa os comerciantes ambulantes completamente vulneráveis, já que o Executivo pode cancelar as autorizações a qualquer momento, sem direito a indenização ou recurso administrativo.
Durante o processo de tramitação, dois vereadores que inicialmente apoiavam a proposta mudaram de posicionamento. Maguinho Nóbrega retirou sua assinatura após reavaliar o texto, declarando que a emenda "afronta a legislação vigente sobre licitações e abre brechas preocupantes". Giovana Costa seguiu o mesmo caminho, citando "receio de que o texto aprovado possa conter vícios de inconstitucionalidade".
A reversão de posicionamento dos dois parlamentares evidencia o caráter questionável da medida aprovada. Ambos reconheceram publicamente que as informações técnicas apresentadas durante o debate revelaram inconsistências jurídicas significativas no projeto original.
Observadores do cenário político municipal interpretam a aprovação como uma jogada eleitoreira dos demais vereadores. Ao votarem favoravelmente, os parlamentares buscaram agradar as famílias dos ambulantes sem considerar as consequências jurídicas e administrativas da decisão. A estratégia privilegia o apelo popular em detrimento da responsabilidade legislativa.
A questão dos vendedores ambulantes em Cataguases demanda solução urgente e definitiva. Porém, a alternativa aprovada pelos vereadores oferece apenas uma regulamentação precária que mantém os trabalhadores em situação de insegurança jurídica permanente. Uma licitação específica seria o caminho adequado para resolver a questão de forma transparente e legal.
A constitucionalidade da emenda aprovada permanece duvidosa. Juristas consultados apontam que a Constituição Federal exige, como regra geral, processo licitatório para cessão de bens públicos. As exceções previstas em lei são taxativas e específicas, não comportando interpretações extensivas como a proposta pelo projeto cataguasense.
O prefeito José Henriques ainda não se manifestou sobre sua intenção de sancionar ou vetar a medida. Caso opte pela sanção, a lei enfrentará questionamentos judiciais praticamente certos. O Ministério Público já sinalizou que acompanhará de perto a implementação da norma.
Especialistas em direito administrativo preveem que a aprovação da emenda resultará em judicialização da questão. A Promotoria de Justiça possui instrumentos legais para questionar a constitucionalidade da lei nos tribunais, podendo suspender seus efeitos através de ação civil pública.
A polêmica em Cataguases ilustra um problema recorrente no legislativo brasileiro: a aprovação de medidas populistas que ignoram aspectos técnicos e jurídicos fundamentais. Os vereadores priorizaram a imagem política imediata em detrimento da segurança jurídica e da boa governança.
O episódio também revela a fragilidade do controle interno exercido pela Câmara Municipal. A persistência dos parlamentares em aprovar projeto questionado pelo Ministério Público demonstra descaso com a responsabilidade legislativa e com os princípios constitucionais que regem a administração pública.
Com a aprovação da emenda, Cataguases caminha para um embate judicial que poderia ter sido evitado. Os comerciantes ambulantes, que aguardavam solução definitiva para suas situações, continuarão na incerteza se a lei irá valer ou não. A responsabilidade pelo prolongamento do problema recai sobre os 12 vereadores que optaram pelo caminho juridicamente questionável.
Por Mídia Mineira.
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